"Distância em Astronomia"
Rui Jorge Agostinho
Departamento de Física
da
Faculdade de Ciências
da
Universidade de Lisboa
http://milkyway.oal.ul.pt/~ruiag
1. O Problema Indomado
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Em linguagem corrente as distâncias no universo
são "muito grandes", ou diz-se mesmo... "é muito
longe!"
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Por isso não são inteligíveis.
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Como não são racionalizáveis...
TORNAM-SE ABSTRATAS
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O problema imediato na aula:
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Os alunos
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passam a decorar os números!
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desmotivam a aprendizagem!
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Perde-se o fascínio do Universo!
2. A Grande Solução
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É FÁCIL: Tornar as distâncias cósmicas
perceptíveis, palpáveis, racionais, ou seja inteligíveis!
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COMO? Recorrendo ao único método que tira
partido do modo de funcionamento da percepção humana:
A COMPARAÇÃO!
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exemplo: a Lua parece diminuir de tamanho quando está
no alto, pois os olhos deixam de ter um termo de comparação
(o horizonte) para estimar a sua distância... muito longe => deve
ficar menor.
3. Medir... A Grande Aposta
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Comparar distâncias, ou MEDIR, significa utilizar
uma distância como base (UNIDADE) e a outra como a grandeza a medir.
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MAS... a nossa inteligência só percebe, interioriza,
racionaliza... "MEDE BEM", as distâncias que estão numa relação
pequena entre si. "1, 2, 3 e ... muitos"
USAR SEMPRE UNIDADES NAS
QUAIS
AS DISTÂNCIAS SÃO
EXPRESSAS EM
VALORES PEQUENOS!
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Isto implica:
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Adaptar a unidade de medição
à distância que se quer medir.
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Ou seja, a escala de distâncias
depende daquilo que quero medir.
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EXEMPLO: Ninguém (no seu perfeito juízo)
quererá medir a distância do Algarve ao Minho em Fermi!!!!
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Assim, consoante a escala de
distâncias de que queremos falar na aula (ex: sistema
solar, estrelas vizinhas, a nossa galáxia, as galáxias vizinhas,
os grupos de galáxias próximos, etc) deveremos
escolher uma unidade de distância apropriada.
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Disto daremos exemplos nos próximos 236 episódios!
4. Sistema Solar... um Must
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Nesta "nossa casa" constituída por oito planetas
grandes, mais de 53 luas, 24 planetas pequenos, não sei quantos
asteróides, e outros tantos cometas...
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Estes corpos estão distribuídos até
uma distância de 9,0x109 km...
é muito longe!
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MAS... usando a distância
Terra-Sol como unidade (astronómica,
1UA=150x106 km) esta distância é de 60
UA. É melhor!
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Como a Terra é um planeta muito interior ao Sistema
Solar, o melhor seria usar a distância Júpiter-Sol
como unidade. Deste modo obteríamos 18!
...muito melhor!
5. Distâncias às
Estrelas
(Plêiades)
5.1 O Parsec... por
amor
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E a que distância está a estrela mais próxima?
para descobrir há que medi-la. Usa-se um método geométrico:
a paralaxe.
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Como o ângulo pi<<1 (radianos) então: tan(pi)
= pi numéricamente.
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O que leva a
d(UA)= 1/pi (rad)
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Mas como o ângulo pi efectivamente medido
é muito pequeno, pois anda na ordem dos décimos a milésimos
de segundos de arco, na equação anterior podemos substituir
o pi em radianos por um pi em " (segundos de arco).
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Obtemos assim: d (UA)
= 206265 (UA) /pi(")
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Definido a distância 206265 UA como 1
(unidade) e batizando-a de parsec (paralax of
one arc second) fica finalmente:
d (pc) = 1/pi(")
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Porque é que o parsec
é a unidade natural
na astronomia? porque os deslocamentos
relativos das estrelas no céu, medem-se como mudança
de posição angular => medir o ângulo pi
em pequenas fracções (0,1-0,001) de segundos de arco (")
!
PARSEC: distância
média entre as estrelas
próximas do Sol,
na nossa galáxia.
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Quão útil é este método, na
prática? o satélite Hipparcos mediu paralaxes pi com
uma precisão de 0,002", ou seja, para um erro máximo de 10%
ficamos limitados a distâncias de 50 pc.
5.2 Ano-luz... o anjo-mau
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É corrente nas escolas usar-se o ano-luz (al)
como unidade preferencial para distâncias.
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MAS... o al só
é útil quando quero saber quanto tempo demora a luz a chegar.
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Usar o ano-luz é equivalente a inventar uma unidade
de distância designada por "hora-carro", que corresponda
numéricamente (apenas) ao tempo que demoraria um automóvel
à velocidade constante de 100 km/h, a percorrer uma certa distância.
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Exemplo: a distância Algarve-Minho seria de 6,0
hora-carro. Toparam esta, hem?
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Mesmo assim a unidade "hora-carro" é de muito mais
fácil apreensão do que o al pois à velocidade
de 100 km/h estamos nós habituados. Mas andarmos a 299 792,458 km/s
ninguém sabe o que isto é... é muita fruta
(e não está à venda na Indonésia)!
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O ano-luz é muito prático para saber que,
quando precisar de "dizer" à sonda Huygens para travar e entrar
na atmosfera da lua Titão, o terei de fazer 75 minutos ANTES!
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Ou saber que hoje, com o meu pequeno telescópio,
vou ver a galáxia de Andrómeda como ela era há 2,3
milhões de anos!
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Ou que me bronzeio na praia com uma luz
solar já velha de 8,32 minutos...
6. A Galáxia de...
areia
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O Sol NÃO está no centro da Galáxia.
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a distância do Sol ao centro
da galáxia é de R0= 8 kpc.
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O Sol NÃO está na periferia da galáxia.
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As estrelas do disco galáctico
espraiam-se pelo menos até aos 25 kpc.
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O Sol NÃO está a meio da galáxia.
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As núvens gasosas que existem
na galáxia distribuem-se até aos 50 kpc.
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Como se medem estas distâncias?
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Será por paralaxe? evidente
que não.
6.1 Distância Fotométrica
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Aqui, não se usam mais métodos geométricos,
mas apenas métodos astrofísicos,
nomeadamente: o enfraquecimento do brilho de uma
estrela com a distância! Sabemos que o brilho diminui
com d-2.
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Basta saber qual é o brilho intrínseco que
a estrela tem (Magnitude Absoluta, Mv) e depois compará-lo
com o brilho observado (Magnitude Aparente, V)
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Truque de magia simples: a Magnitude Absoluta deriva-se
por cálculos teóricos sobre a estrutura da atmosfera das
estrelas. Ooops... aqui as coisas fiam fino!
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Mas há tabelas com Mv
para todos os tipos de estrelas, à venda num hipermercado ao pé
de si!
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Uma vez sabido o Mv e medido o V com o telescópio
(exige um bom fotómetro ou CCD e conhecimentos de fotometria), resolve-se
a equação:
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Mais uma vez a distância d vem em parsec....
(é mesmo um caso de amor à primeira vista, esta do parsec!)
6.2 A Via Láctea
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Olhemos para a figura seguinte que esquematicamente representa
a nossa galáxia:
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Quase poderíamos dizer que o Sol está a
1/5 do raio da galáxia.
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Vice-versa, a galáxia tem como raio (mais ou menos)
5 vezes a distância do Sol ao centro galáctico.
(M51)
7. O Grupo Local
de Galáxias
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As galáxias tendem a agrupar-se gravitacionalmente.
A Via Láctea pertence a um grupo que engloba 23 galáxias.
Destas, a maior é a de Anrómeda (10x mais massa que a nossa)
e a nossa é a segunda maior.
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As galáxias mais pequenas estão "presas"
a estas duas gigantes, como se pode ver na figura. Andrómeda tem
como companheiras M32 e NGC205.
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A Via Láctea está a canibalizar as Núvens
de Magalhães (a 55 kpc) e a pequena Dwingelow (a 8kpc).
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Como se medem estas distâncias? observando Cefeidas
e RR Lyras nestas galáxias.
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A distância de nós até Andrómeda
é de 700 kpc: é muito longe
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MAS... se dissermos que
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então a distâncias entre as duas galáxias
já não é assim tão escandaloso!
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O tamanho do Grupo Local é aproximadamente de 900
kpc, ou seja, 10x maior que o tamanho da Via Láctea, ...números
redondos!
8. O Super-Grupo Local
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A medição destas distâncias tem sido
feita com Hubble Space Telescope que observa estrelas Cefeidas, que têm
luminosidades (brilhos intrínsecos e Mv) bem calibradas.
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Isto tem permitido obter os primeiros pontos da recta
de calibração da Lei de Hubble que relaciona a velocidade
de expansão do Universo com a distância a que as galáxias
estão.
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O Supergrupo tem dimensäes aproximadas de 30 Mpc,
em raio... é muito grande! claro que é.
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MAS... o truque é
usar o TAMANHO do Grupo Local como
unidade de distância. O grupo local tem um tamanho que
é aproximadamente 1 Mpc. o que implica que o super grupo
é 30 vezes maior (em raio).
9. Distâncias em Larga
Escala
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Para medir distâncias maiores usam-se galáxias
espirais inteiras, como "velas padrão", isto é, que têm
brilhos intrínsecos (Mv) bem determinados, pela Lei de
Tully-Fisher.
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Para escalas já quase cosmológicas usam-se
explosões estelares (SUPERNOVAS) como "velas padrão" de brilho
bem determinado (as supernovas do tipo Ia).
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Estes métodos permitem calibrar e
DETERMINAR A LEI DE HUBBLE
OU SEJA:
A EXPANSÃO DO
UNIVERSO!
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E a partir daqui já é tudo quase imaginação
para quem queira apreender as distâncias. É mais um exercício
de sonho, prazer e fascinação, que deixamos para a alma de
poeta que existe em todos nós.
10. Epílogo
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E a natureza humana no meio deste infinito tão
grande pergunta:
QUEM SOU EU ?